quinta-feira, 23 de julho de 2020

Boi Aruá: Análise

Comprei o dvd por meio do site oficial da Liberato Produções:


Boi Aruá é um filme de animação dirigido pelo baiano Chico Liberato, com roteiro do próprio cineasta e de sua esposa Alba Liberato. A história é uma adaptação de diversas fontes como cordéis e romances populares do ciclo do boi, mas principalmente o conto homônimo de Luís Jardim.

O livro Boi Aruá, de Luís Jardim, é um caso de história dentro da história. É sobre uns meninos que ouvem histórias de uma velha negra, sendo uma dessas histórias a que dá origem ao filme. No entanto há muitas liberdades em relação a obra do Luís Jardim, a começar pelo nome do personagem principal que no filme é chamado de Tibúrcio.


No filme, tal como no livro, Tibúrcio é um personagem orgulhoso e autoritário. Tudo deve ser feito à sua maneira e ele procura demonstra com seu punho firme que é o melhor em todas as tarefas. Uma demonstração de sua personalidade está em um quadro da sala de sua casa, que mostra seu retrato sisudo adornado com os dizeres: eu por primeiro, os amigos por derradeiro. Tibúrcio então é atormentado pela aparição de um boi mítico inalcançável, o boi Aruá, que em sua primeira aparição transforma-se logo na constelação Cruzeiro do Sul. Esse conceito de um boi metamorfo, é um adição original do filme (se muito bem me recordo da história de Jardim). A aparição desse barbatão, entretanto, é profetizado por um negro corcunda como prenúncio de tempos ruins. A vontade descabida de Tibúrcio em mostrar-se valente o suficiente para pegar o boi Aruá leva-o a sua ruína. Até ouvir a profecia de uma velha senhora de que aquele que conseguir capturá-lo terá grande fortuna. Tibúrcio precisa vencer o boi para recuperar-se da ruína, mas para isso será necessário antes vencer a si mesmo e o próprio orgulho.

No filme, Chico Liberato mistura um desenho inspirado nas xilogravuras chapadas dos gravuristas dos folhetos de cordel e armoriais, como Jota Borges e Gilvan Samico, com um estilo ligeiramente surrealista que me lembra um pouco Chromophobia de Raoul Servais e outras animações da mesma época. Essa mistura de cores e padrões surrealistas com a estética de inspiração medieval típica das xilos de cordel cria no filme um ambiente estético mítico bastante característico que o aproxima à estética armorial.



Em minha opinião, o filme peca apenas em sua trilha sonora. Apesar de contar com belíssimas músicas originais de Carlos Pita e Elomar Figueira Mello, a trilha criada por Ernst Widmer é, na realidade, uma tentativa não tão bem sucedida do compositor suíço de criar uma sinfonia brasileira-sertaneja. O resultado é uma confusão sonora que ora dá tons demasiadamente sombrios, ora promove uma barulheira na tentativa de criar uma onomatopeia musical para o som de cascos de cavalo. A trilha não evoca de forma alguma as cores opacas e a tradição medieval sugerida pelo desenho. Em minha opinião, Cussy de Almeida teria sido um nome melhor para compor uma peça digna do brilhantismo nordestinamente psicodélico de Boi Aruá.



No mais é uma obra brilhante que vale à pena ser assistida diversas vezes.

Huni Kuin: Yube Baitana: Análise

De graça no itch.io: https://huni-kuin.itch.io/hk

Uma ode à oralidade

É difícil falar de um jogo que é tão bom, mas que poderia ter sido ainda melhor se tivesse tido o privilégio de um orçamento grande. Basicamente tudo o que se espera de um jogo de plataforma, Huni Kuin faz muito bem. Ao mesmo tempo, todos os pontos positivos poderiam ser melhores se o orçamento para a criação desse game fosse maior.

PROS

  • Arte: Acredito ser um dos pontos altos de game. Praticamente toda a arte visual dos níveis e dos personagens é muito bonita.
  • Trilha-sonora: Ainda que a trilha sonora não tenha sido original para o jogo (ao que parece são canções parte do disco Amazon Essemble & Huni Kuin), deu para perceber que foram muito bem escolhidas, pois elas contribuem muito bem para a ambientação.
  • História: O jogo é composto por diversas histórias adaptadas de contos que fazem parte da cultura Huni Kuin. Em geral são bem interessantes e de alto nível cultural.
  • Narrativa: Cada história do jogo é contada em língua autóctone seguindo - de forma mais fiel possível - as histórias da tribo.
  • Nível de dificuldade: Acredito que o nível de dificuldade está em equilíbrio com o tamanho das fases. De forma geral é um jogo fácil, mais para o nível do casual. O caso é que não há checkpoints no jogo e se ele fosse mais difícil talvez fosse necessário fases maiores e com checkpoints.
Para progredir é preciso conversar com o pajé

CONTRAS

  • Cutscenes: Parece sacanagem de minha parte falar mal das artes das cutscenes, afinal foram claramente feitas por um artista amador da própria tribo representada pelo jogo. Se por um lado isso contribui para a ambientação educativa do jogo, por outro, a César o que é de César, as artes não tem uma qualidade melhor do que teria se eu mesmo (no auge da minha ignorância artística) tivesse feito.
  • Bugs: Não são muitos, mas existem. Alguns são simples defeitos na animação, outros podem atrapalhar um pouco.

HISTÓRIA

É possível jogar na língua original Huin Kuin.

Não farei irei me deter nesse quesito, pois o jogo é composto por diversas histórias e, se eu quisesse ser justo, teria de analisar uma por uma. Em um plano geral você controla um Huni Kuin que irá ouvir as histórias do pajé para que se torne verdadeiramente parte do povo. Se quiser, é possível andar pela aldeia e conversar com outros personagens que irão contar um pouco sobre a tribo e sobre a cultura.

Para avançar é preciso conversar com o pajé e ouvir as histórias, que são as fases do jogo em si. Ao ouvir todas você se torna parte do povo e o jogo termina.

De forma geral as histórias não tem uma lição de moral muito forte. Elas se detém em contar de forma legendária as origens, a forma como o povo chegou ao conhecimento das ervas medicinais e de miração, e como a cultura foi formada desde os tempos imemoriais.

CONSIDERAÇÕES FINAIS


Quebra-cabeças

É um pequeno jogo de alta qualidade. A proposta é a mesma de Never Alone (Kisima Ingitchuna), levar uma cultura autóctone para o conhecimento mundial, mas com um orçamento muito menor. O jogo é bonito e bem urdido. Definitivamente vale a pena ser jogado.

Huni Kuin: Yube Baitana review

For free on itch.io: https://huni-kuin.itch.io/hk


An Ode to Oral Culture
It is kind of hard to review a game so good, but that could be even better if it had the privilege of a big budget. It has everything we expect from a platform, and it is well done. At the same time, all the positive points could be better if it had a bigger budget.

PROS
  • Art style: I believe it is the higher point in this game. Basically all the visual art we found in levels and in the characters are very beautiful.
  • Soundtrack: Even though it isn't an original score, since the songs were takan from the album Amazon Essemble & Huni Kuin, the song were well chosen. They really build the mood we need for each stage.
  • Story: Huni Kuin tells several different stories. In general, they are very interesting and has a high cultural value.
  • Storytelling: Each story is told from indigenous point of view and in native language.
  • Level of difficulty: I believe many people will think it is easy. Actually it is, however I think the difficulty is well balanced when we take account the levels length and the lack of checkpoints.
You can play the stories by talking to the wiseman

CONS
  • Cutscenes: It might be very picky of me, but the cutscenes's artworks isn't very beautiful. I know they choose to use an artwork make by amateur's indigenous instead of by a profissional painter. I know this adds to the educational mood this game has, but I don't think it would make much difference if I (a completely uneducated person in art) had made the artwork myself. I think it would be nicer if they had used a profissional.
  • Bugs: There aren't that many, but they are there. Sometimes they are a little animation bug, sometimes they might hinder the gameplay.
STORY
It is possible to play in Huin Kuin's native language if you want to.

I will not say too much about the story. The game is made by many stories and, if I wanted be fair, I'd have to make an analysis of eachone.

Overall you control a native born Huni Kuin who have to listen to the wiseman's stories so you will became a real Huni Kuin. It is possible, if you want to, to walk around the village and talk to people who will inform you some aspects from the tribe's culture. 

To advance you must talk to the wiseman and listen to the stories he will tell. These stories are the game levels. When you listen to every story you become one with your people and the game ends.

There aren't much of mora of the story. The stories are about origin legends. They explain how the people acquired the knowledge about the forest and how their culture was born since the immemorial ages.

FINAL THOUGHTS

Puzzles


Even though it is small and simples, this game has high quality. I believe the developers wanted to do and Brazilian Never Alone (Kisima Ingitchuna) and take to the the autochthonous culture of the Huni Kuin to world's knowledge. However they had less budget to do so. The game is beautiful and well made.

Play it definitely worth it.